Resoluções de ano-novo

Ah, as resoluções. Mal começa o ano e já temos objetivos para os 365 dias seguintes: ganhar mais dinheiro, gastar menos dinheiro; quitar o cartão de crédito, o carro ou a casa; trocar de emprego, melhorar de vida, descansar - ou, quase certamente, em tempos de sedentarismo, fazer exercícios e emagrecer.

Como li em uma delegacia de polícia sul-africana, contudo, "um objetivo sem um plano é apenas um desejo" (um bom cartaz para nossas delegacias copiarem!). Para cumprir suas resoluções de ano-novo, portanto, é preciso um cérebro que não só seja capaz de desejar e estabelecer objetivos, mas também de traçar planos.

De desejos o cérebro entende: deles trata o sistema de recompensa, que representa igualmente quão bom algo já é como também pode vir a ser (como as roupas do armário voltarem a caber). De objetivos, também: sabendo das recomendações do sistema de recompensa, a parte mais anterior do córtex pré-frontal é capaz tanto de cuidar dos acontecimentos presentes quanto de usar seus conhecimentos atuais (sobre o que sobra na cintura e o que falta no banco, por exemplo) e seus desejos (caber de novo naquela calça) para traçar objetivos para o futuro.

Quanto a tecer estratégias para alcançar as metas, isso fica por conta das porções mais laterais do córtex pré-frontal. Se for esperto e aproveitar o que a neurociência ensina, então, o pré-frontal trata de fazer o sistema de recompensa arranjar desejos módicos, alcançáveis com planos simples. Começar perdendo quatro quilos para depois perder outros quatro, por exemplo, é bem mais factível do que desejar perder oito de cara. Planejar frequentar a academia duas vezes por semana é mais fácil de alcançar do que resolver estoicamente virar rato de academia literalmente da noite para o dia.

O mais importante, contudo, é constatar que o cérebro humano é tanto capaz de sonhar quanto de fazer acontecer. Desejar é bom, mas tecer um plano e passar à resolução é melhor ainda - e traz satisfação dupla: com o resultado, e com o mérito pelo resultado. Faço minhas, então, as belas palavras do poeta Drummond, em sua Receita de Ano Novo: "Para ganhar um Ano Novo que mereça este nome, você, meu caro, tem que merecê-lo, tem que fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre". Que em 2010 você tenha bons desejos e ótimos planos, leitor, e assim saiba fazer seu Ano Novo feliz.

Extraído de Suzana Herculano-Houzel (2025) Neurociência da Vida Comum, originalmente publicado em dezembro de 2009 na Folha de São Paulo

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